terça-feira, 3 de agosto de 2010

Anexo I

Choro por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Choro porque meu coração sangra, com uma dor que não consigo comunicar a ninguém. Recuso todos os toques e ignoro todas tentativas de aproximação. Tenho vergonha de gritar que esta dor é só minha, de pedir que me deixem em paz e só com ela. Sou um cachorro, dono de um único e sagrado osso. Choro porque a única magia que existe é estarmos vivos e, não entendermos nada disso. A única certeza que existe é a nossa incompreensão. Eu sei amar, mas não sei fugir. Por isso, não tente me parar. Não me peça para não ir. Não me diga para tomar cuidado, eu não sei amar mais ou menos. Quando eu decido, eu vou. Entrego-me, arrisco, me corto, me estrepo. Azar o meu. Sorte minha que nasci assim: vim ao mundo para sentir. Meu coração se esgarça, a vida se desfaz e me embolo em mim mesmo, dou um nó mesmo e daí? A vida é minha! O amor é meu. Dou-me de bandeja pra quem eu quiser. Você aí quer? Quer mesmo? Então leva. Mas leva tudo. Leva e não devolve. Só devolve se eu pedir. Só me abandone se eu mandar. Choro porque o amor não tem garantia, mas tem devolução. Pode começar do nada, pode acabar de repente, pode não ter fim. Mas tem sempre um meio. Amor tem gosto de pele, língua e segredo. Amor tem gosto de cobertas, descobertas e travesseiro. Você imagina quantos Jaimes existem em mim? Todo homem é uma surpresa, uma torta mil folhas, um bombom diferente em um lindo papel celofane. Que brega! Quer provar? Posso acordar doce, ficar amargo e até dormir ácido sem você perceber, mas eu quero que você perceba. Eu quero que você se alimente do que há de melhor e pior em mim. Eu quero te mostrar cada gosto, te misturar, te revirar o estômago, jogar a receita fora. (Nada de banho-maria). O amor não tem regras, o desejo não tem limites. Minha boca é do tamanho do meu coração. Odeio banho-maria, nem quente, nem frio. Gosto de extremos. É verdade! “E desde então, parece que meu corpo carrega em si todas as chagas do mundo”. Ter esta consciência me deixou mais sereno, pois sei que sou repleto de fraquezas e mistério. É uma pena saber que ninguém não me conhece como eu gostaria que acontecesse. choro porque sinto um cansaço dentro de mim inesgotável. Preciso justificar minhas faltas, minhas presenças. Quisera não me cobrar nada, porque assim seria mais feliz. Mas me cobro, deixo que me cobrem, responde com ironias. Fujo de situações desagradáveis e mesmo assim, repito porque gostei: Minha boca é do tamanho do meu coração. Coração que aperta e treme e agitado me dá a certeza que ainda preciso chorar mais e mais pra sobreviver aqui.

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Caio Fernando Abreu

Fez muito sentido.

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